SEIDI SÃO PAULO

O que vier na cabeça, sem revisar os textos.

Monday, October 30, 2006

 

Moscou
Selvagem 2
Relato de viagem 2003 - Seidi Kusakano


O café da manhã no hotel é um espetáculo à parte. Desde o conteúdo até as pessoas que ali estão tomando o café. O buffet é farto, constituído de pães, cereais, frios, ovos, iogurte, leite, café, chá e sucos. A lista continua: verduras cruas e cozidas (tomate, repolho, vagem, milho, cebola), uma espécie de chucrute, massas – espécies de ravioli ou talharini -, peixe (esturjão) cozido ou defumado, salada de maionese, ou seja, um verdadeiro almoço, ou melhor, brunch, como os brasileiros gostam de falar hoje em dia.

Nas mesas, salvo algumas exceções como na minha e de algumas famílias comportadas, eram tomados por casais misteriosos. Sempre o homem era estrangeiro e a mulher, russa. O meu caráter de voyeur acabou se revelando e fiquei atento a um casal que estava na mesa ao lado. O homem era australiano, algo como 40 anos, cabelo preto, vestido de preto e imagino que ele trabalha com computador. Não sei porque, mas o meu instinto indicou isso. Um sujeito comum. Poderia estar com uma australiana comum, levando uma vida comum. Mas veio em busca de uma mulher russa, nessa terra de MENOS TRINTA GRAUS CENTÍGRADOS. A mulher, confesso, não sei como, mas ela não era tão bonita, exceto os olhos, que eram de cor azul-esverdeado. No meio de tantas mulheres bonitas aqui na Rússia não sei como conseguiu achar uma assim. Talvez ela deva ter exagerado nos recursos tecnológicos disponíveis no software Paintshop, quando mandou fotos para ele via internet.

Uma certa vez, por curiosidade (repito, apenas por curiosidade) entrei num site de serviços matrimoniais da Rússia. Nomes como Natasha, Irina e Svetlana desfilam na galeria de fotos. A grande maioria não é bonita, talvez pelas fotos e maquiagens anos 70, roupas, idem. Elas são estudantes, professoras, jornalistas e loucas para sair do país. Muitas têm filhinhos. Para poder conversar com essas meninas basta virar sócio pagando algo como 100 dólares mensais.

“Na Austrália, eu como mais cereais de manhã”, ele explicava com grande esforço a sua vida lá falando vagarosamente o seu inglês de Crocodilo Dundee para que a moça o compreendesse. Ela, calada, só resmungava “yes”, por educação. Nada empolgante. De repente, no restaurante, começa a tocar a música Go West do grupo inglês dos anos 80 – 90, Pet Shop Boys. Vamos para o Oeste, é onde há vida mais segura, marido com emprego estável, casa no subúrbio, uma van na garagem, um cachorro e, quem sabe, ter um casal de filhos adoráveis. Não mais miséria, não mais máfia, não mais o salário de USD 100 por mês, não mais o futuro incerto. Vamos para o Oeste.

No dia seguinte, o senhor da terra dos cangurus estava na apteka (farmácia) do hotel. Ele, timidamente, pediu à atendente, lindíssima, visual Anna Kurnikova de uns 18 anos, que estava atrás do balcão: “two (2) ...AGRAS, please.” Ela de maneira tipicamente russa (= agressiva) questionou “What??”, enrugando as sobrancelhas. Ele criou coragem e repetiu: “two VI-A-GRAS, please...” Deve ter sido o efeito do frio, com certeza. Tem que ser isso, não é? Na terra dele ele funcionaria melhor. Tudo seria melhor. Mas vamos agüentar um pouco. Até chegar na Austrália.
(Continua...)
(Foto: www.educared.org.ar)

Comments:
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Olá, Seidi, tudo bem?
Estou gostando muito das suas 'viagens russas'!
Curiosamente, nos últimos dias, um nome não me saía da cabeça: 'Olenska'. 'De onde será que eu tirei isso?', pensei, e descobri, pelo Google, que é um dos personagens de A Era da Inocência, de Edith Wharton (cujo papel no cinema foi de Michelle Pfeiffer). E o estranho é que eu imaginei ser um nome de mulher ou de cidade e, apesar de ter assistido ao filme e saber que havia um personagem relacionado ao Leste Europeu, não cheguei a memorizar o nome.

Abs,
Cris
 
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